Cultura é a liderança em ação
- Luana Gabriela
- 25 de jun.
- 4 min de leitura
E o que, de fato, podemos fazer com isso?
De tempos em tempos, o mundo dos negócios e da gestão se apaixona por um novo conceito. Já vimos isso com a qualidade total, a reengenharia, a produção enxuta. Depois vieram os canvas, as startups, a inovação disruptiva. E agora — talvez mais do que nunca — estamos falando de cultura organizacional.
Cultura virou buzzword. E como toda palavra da moda, corre o risco de ser esvaziada, distorcida, mal interpretada. A diferença aqui é que, ao contrário de outras modas gerenciais, a cultura não é um método. Nem um processo. Nem uma iniciativa com começo, meio e fim. Cultura é… gente.
E gente não se ajusta num slide de PowerPoint.
A Exame, recentemente, publicou que empresas estão “ajustando sua cultura interna”. Ajustar a cultura é como tentar desviar o curso de um rio com as próprias mãos. Pode funcionar em escala local, mas é ingovernável sem consciência coletiva, persistência e exemplo. Cultura não é criada num comitê — ela é vivida nas microações do dia a dia. Nas conversas de corredor. Nos silêncios. Nos e-mails. Nos olhares. E, especialmente, na forma como as lideranças atuam.
Cultura é a liderança em prática.
Uma pesquisa recente publicada na The Economist, com base na análise de IA de mais de 900 empresas a partir de reviews do Glassdoor, reforça essa premissa. Liderança forte está diretamente associada a culturas mais saudáveis e de apoio. E mais: não existe uma fórmula única de cultura — o que realmente importa é o alinhamento entre o que a empresa valoriza e o que seus colaboradores consideram importante. Como afirma Donald Sull, cofundador da CultureX e pesquisador do MIT Sloan, o objetivo não é padronizar, mas ajudar pessoas a encontrarem ambientes onde possam florescer.
Liderança não é apenas um componente da cultura — é o principal mecanismo de transmissão dela.

O estudo mostra que os comportamentos da liderança têm mais correlação com os resultados culturais de uma empresa do que programas de RH, declarações de missão ou benefícios. Desenvolver líderes, portanto, é investir diretamente na cultura — e na competitividade — da organização.
O problema não é a cultura. É sempre a forma como escolhemos (ou não) nos relacionar com ela.
Ao longo dos últimos anos, tivemos o privilégio de apoiar organizações na construção — ou reconstrução — de suas culturas. E, se há uma conclusão que se repete, é esta: a cultura não é o problema. O problema é quando fingimos que ela não existe. Ou pior, quando achamos que podemos controlá-la com slogans, campanhas internas e quadros na parede.
Para ilustrar, gosto de pensar nas abelhas.

Abelhas não têm programa de onboarding. Não fazem workshop de integração. Não têm metas trimestrais ou reuniões one-on-one. Mesmo assim, produzem mel em equipe com uma precisão quase poética. Por quê?
Duas hipóteses simples:
Produzir mel faz parte da natureza delas — está no código.
As mais jovens observam as mais velhas e repetem seus comportamentos.
Se transportarmos isso para o ambiente organizacional, a metáfora ganha força. Porque, no fim, a cultura é isso: padrões de comportamento que se replicam ao longo do tempo. E esses padrões se formam a partir das referências que temos.
Os líderes, portanto, não são só exemplos — são espelhos.
E é aí que tudo começa a fazer sentido.
Cultura é o que se repete.
Se cultura é o padrão de interações humanas dentro de uma organização, e esse padrão é formado pelo comportamento cotidiano das pessoas, então a equação é simples:
Mudar a cultura = mudar os comportamentos que se repetem.
E o melhor jeito de mudar os comportamentos que se repetem é influenciar quem tem maior capacidade de moldar esse padrão: as lideranças.
Mas não se engane. Transformar comportamento não é sobre “corrigir” o outro. É sobre iniciar um movimento por dentro. A mudança real começa com um líder disposto a revisitar seu próprio propósito, revisar suas incoerências, transformar suas ações.
É a transformação interna que antecede (e sustenta) qualquer transformação externa.
E isso dá trabalho.
Porque não adianta você mudar se ninguém mais mudar com você. E, muitas vezes, essa mudança é invisível no início. Porque cultura também é isso: lenta, subjetiva, relacional.
Pense na distância — simbólica e concreta — entre a CEO de uma empresa e um operador de caixa de uma de suas unidades. O que acontece nesse espaço entre um e outro é o terreno fértil (ou estéril) onde a cultura se manifesta. Liderar, portanto, é também encurtar distâncias.
E, quando bem cultivada, a cultura se torna ponte entre propósito e ação.
O que sua cultura revela?
Uma empresa que compreende sua cultura como expressão viva do seu propósito — e não como algo colado num manual institucional — é capaz de inspirar. E mais: de engajar pessoas num processo de autodescoberta que conecta suas jornadas individuais com o todo maior.
E isso é potente.
Então, talvez a pergunta não seja mais “como ajustar a cultura da minha empresa?”. Talvez a pergunta mais honesta e transformadora seja:
O que EU posso fazer, HOJE, para me tornar o exemplo da cultura que desejo ver florescer?
Essa não é uma pergunta sobre gestão. É sobre consciência.
E talvez, só talvez, seja isso que nos falta menos do que ferramentas — coragem para começar de dentro.
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